Pessoas participam de protesto em frente à residência oficial da primeira-ministra japonesa em Tóquio, Japão, em 28 de novembro de 2025. (Xinhua/Jia Haocheng)
"Criminosos de guerra continuam sendo homenageados no Santuário Yasukuni, até mesmo por políticos de alto escalão. O Japão ainda se refere à sua invasão da China como um ‘incidente’", disse à Xinhua o editor e escritor alemão Frank Schumann.
Berlim, 1º dez (Xinhua) -- O presidente alemão, Frank-Walter Steinmeier, durante uma visita recente à cidade espanhola de Guernica, esteve no local antes devastado por um bombardeio aéreo nazista e classificou o ataque de 1937 como "um crime brutal, cujo único alvo foi a população civil", prometendo que a Alemanha "não esquecerá" o sofrimento causado.
A visita reacendeu a reflexão sobre a responsabilidade em tempos de guerra e acentuou o contraste com o Japão. Embora a Alemanha e o Japão tenham sido ambos países de origem da Segunda Guerra Mundial e, em última análise, potências derrotadas, suas atitudes em relação à responsabilidade histórica divergem drasticamente.
Acadêmicos alemães dizem que, enquanto o mundo comemora o 80º aniversário da vitória na guerra antifascista, o Japão ainda não confrontou questões fundamentais sobre sua agressão e responsabilidade em tempos de guerra, revelando uma falta de profunda introspecção e uma narrativa histórica distorcida.
A ausência, argumentam eles, agora é refletida nas declarações mais recentes da primeira-ministra japonesa, Sanae Takaichi, sobre Taiwan, comentários vistos como um desafio direto à ordem internacional do pós-guerra e uma séria ameaça à paz e à estabilidade regional.
ACERTO DE CONTAS INACABADO
"Durante a guerra, a ideologia fascista de superioridade racial na Alemanha e no Japão diferia muito pouco", disse o editor e escritor alemão, Frank Schumann, em entrevista por escrito à Xinhua.
Ele disse que ambos os países espalharam "terror e guerra pelo mundo para conquistar territórios e roubar recursos naturais". Após a guerra, observou ele, a Alemanha desmantelou o nazismo por meio de confiscos de bens, expurgos da influência nazista na educação e no judiciário e educação antifascista sistemática na mídia e na academia. "Em sua essência, a questão sempre foi: Por que existe guerra?".
Ele argumentou que o Japão nunca passou pelo mesmo acerto de contas.
"Criminosos de guerra continuam sendo homenageados no Santuário Yasukuni, inclusive por políticos de alto escalão. O Japão ainda se refere à sua invasão da China como um ‘incidente’", disse Schumann.
Richard A. Black, pesquisador sênior do Instituto Schiller, na Alemanha, disse que o Japão suavizou seu histórico de guerra ao reescrever livros didáticos, deixando as gerações mais jovens com pouco conhecimento de seu passado militarista.
Ele observou que Takaichi visitou repetidamente o Santuário Yasukuni e alegou que as avaliações internacionais da conduta do Japão durante a guerra são "falsas" e "exageradas".
"(O que ela está fazendo) é extremamente perigoso", disse Black.

Pessoas participam de uma cerimônia em comemoração ao 80º aniversário do fim da Segunda Guerra Mundial na Europa, no Portão de Brandemburgo, em Berlim, Alemanha, em 8 de maio de 2025. (Xinhua/Du Zheyu)
NARRATIVA DE VÍTIMA
O historiador alemão, Takuma Melber, disse que o Japão continua se apoiando em uma narrativa de vítima em relação à Segunda Guerra Mundial, com sua responsabilidade por iniciar a guerra sendo abordada de forma superficial. "No Japão, as narrativas públicas da Segunda Guerra Mundial ainda começam com a derrota do país, em vez de sua responsabilidade por iniciar a guerra", disse ele.
Os museus no Japão tendem a se concentrar nos meses finais da guerra e a destacar a devastação infligida ao país, particularmente os bombardeios atômicos de Hiroshima e de Nagasaki, disse Melber. "O Japão se vê principalmente como a última vítima da Segunda Guerra Mundial".
O jornal alemão Frankfurter Rundschau noticiou que algumas forças de direita no Japão continuam retratando a agressão do país durante a guerra como a "libertação" da Ásia Oriental e pressionaram pela revisão da constituição pacifista como um passo rumo ao rearmamento.
Os comentários de Takaichi, segundo o jornal, refletem "os valores centrais da ideologia conservadora de direita do Japão", e sua posição sobre a história visa fortalecer sua influência dentro do Partido Liberal Democrático, no poder.
CONSEQUÊNCIAS DIPLOMÁTICAS
O interesse de Schumann pelas ações do Japão durante a guerra começou anos atrás, quando seu filho, então estudante no Japão, encontrou uma antiga fábrica de gás venenoso na Ilha de Okunoshima, antigamente escondida do público e usada para fabricar armas químicas.
Agora, preparando um livro sobre crimes de guerra japoneses, Schumann disse que a pesquisa em arquivos não o preparou completamente para o que viu ao visitar locais históricos na China.
Ele alertou que a ordem internacional do pós-guerra enfrenta "desafios enormes", tornando a reflexão histórica ainda mais urgente. "Só aprendendo com a história", disse ele, "podemos evitar repetir os mesmos erros".
As repercussões podem ir além da política interna. A revista alemã Der Spiegel citou Koichi Nakano, professor de política internacional da Universidade Sophia, em Tóquio, alertando que as visões revisionistas de Takaichi "poderiam prejudicar seriamente as principais relações do país com a China e a Coreia do Sul, potencialmente mergulhando o Japão em um desastre diplomático".
O jornal alemão Süddeutsche Zeitung noticiou que Takaichi visitou o Santuário Yasukuni mesmo enquanto era ministra, uma atitude que já prejudicou diversas vezes as relações diplomáticas do Japão.


